A teoria do desvio produtivo a luz do direito do trabalho

No texto do último post analisamos a teoria do desvio produtivo sob a ótica do direito do consumidor. Como vimos, esta teoria surgiu através de uma tese de autoria do advogado Marcos Dessaune, que se caracteriza quando o consumidor precisa desperdiçar seu tempo e desviar as suas competências – de uma atividade necessária ou por ele preferida – para resolver problemas de consumo criado pelo fornecedor, que sequer deveriam existir, por exemplo, cancelamento de produtos não pedidos (cartões de crédito, planos de telefone, entre outras), gerando com isso um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável que é o tempo do consumidor.

O prejuízo decorrente do tempo desperdiçado e da vida alterada é o pilar da teoria do desvio produtivo do consumidor, que apresenta aplicabilidade crescente em nossos Tribunais. E se isto já era uma realidade sob a ótica do consumidor, agora os Tribunais Trabalhistas têm começado a ser curvar sob a sua aplicação quanto a situações que a lei disciplina obrigatoriamente para o empregador, e se não o faz gera um desgaste de tempo e possível dano moral para o empregador, por exemplo, a ausência de registro na CTPS ou baixa sendo o contrato de trabalho incontroverso, ou o não pagamento de verbas rescisórias.

Traçam a seguinte premissa que se o bem tutelado da referida teoria é o tempo, e ao empregador ao deixar de registrar um funcionário ou dar baixa na CTPS de um funcionário registrado, ou não pagar as verbas rescisórias no prazo correto que é decorrente da relação de emprego, poderá gerar para o empregado uma perda de tempo, (na hipótese de ter que demandar judicialmente pelo cumprimento desta obrigação) ou ser privado de nova admissão num novo emprego (pela ausência de registro).

Nesta linha o TST, ao julgar o Recurso Especial, processo TST-AIRR – 1380-97.2018.5.17.0141, da Min. Relatora, KÁTIA MAGALHÃES ARRUDA, assim decidiu:

“A empresa, em razão do não reconhecimento do vínculo empregatício, não efetuou o pagamento das parcelas rescisórias e deixou de registrar e dar baixa do contrato de trabalho na CTPS, motivo pelo qual resta presumível o dano daí decorrente, que influencia até mesmo na busca de novo emprego.

Outrossim, pode-se utilizar ao caso, por analogia, o entendimento que ora vem se tornando pacífico no âmbito do E. STJ no que tange às relações de consumo, que diz respeito à teoria do desvio produtivo.

Segundo Marcos Dessaune, principal expoente, no Brasil, pelo desenvolvimento da chamada Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor:

(…) o desvio produtivo caracteriza-se quando o consumidor, diante de uma situação de mau atendimento, precisa desperdiçar o seu tempo e desviar as suas competências – de uma atividade necessária ou por ele
preferida – para tentar resolver um problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável.

Nesse sentido, aquela Corte Superior tem entendido que nos casos em que o fornecedor deixa de praticar ato que lhe era imposto, levando o consumidor ao desgaste de obter o bem da vida em juízo, impõe-se a condenação daquele ao pagamento de uma indenização em razão do tempo perdido pelo hipossuficiente.

Peço vênia para colacionar trecho de decisão recente prolatada em sede de recurso especial, pelo Exmº Ministro Moura Ribeiro (REsp 1763052, Data da Publicação, 27/09/2018). Nessa brilhante decisão, o Ministro assentou claramente que aquele que ao realizar (ou não realizar) ato que lhe competia, levando à parte contrária ao desperdício do seu tempo para solucionar questão que não deu causa, deve ressarcir os prejuízos morais causados:

É manifesto que o bloqueio do cartão de crédito da autora, impossibilitando-a de realizar compra quando se encontrava na boca do caixa, sem comunicação prévia e de forma infundada, expondo-a a constrangimento e ensejando o dever de indenizar o dano moral. A hipótese dos autos bem caracteriza aquilo que a doutrina consumerista contemporânea identifica como desvio produtivo do consumo, assim entendido como a situação caracterizada quando o consumidor, diante de uma situação de mau atendimento em sentido amplo precisa desperdiçar o seu tempo e desviar as suas competências de uma atividade necessária ou por ele preferida para tentar resolver um problema criado pelo fornecedor, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável. Em outra perspectiva, o desvio produtivo evidencia-se quando o fornecedor, ao descumprir sua missão e praticar ato ilícito, independentemente de culpa, impõe ao consumidor um relevante ônus produtivo indesejado por este, onerando indevidamente seus recursos produtivos, in verbis: (…) O desserviço praticado pela Apelante prejudica a prática dos atos da vida civil e provocam aborrecimentos que superam os do cotidiano, configurando dano moral, gerando obrigação de indenizar, independentemente de prova atinente a prejuízo material,pois se trata de dano in re ipsa, com fulcro no artigo 186 e 927, do CC, c/c artigo 5, X, da CFRB)

Diante das similaridades existentes entre as relações de consumo e de trabalho, em especial a característica de hipossuficiência do consumidor e do trabalhador, entendo plenamente cabível nessa Especializada a referida teoria, impondo-se ao empregador que descumprir dever legal que lhe competia, levando o trabalhador ao desgaste de ajuizar uma ação para obter o bem da vida (incontroverso diga-se de passagem, pois a baixa da CTPS é dever do empregador) ao pagamento de uma reparação por danos morais.

Assim, irreparável a condenação da reclamada em danos morais.

Evidenciado o sofrimento ensejado pela atitude abusiva da reclamada ao sonegar direitos básicos do trabalhador, resta inegável o direito à reparação, principalmente em se considerando que a responsabilidade social coloca a economia a serviço do bem-estar das pessoas…”

Destarte, vê-se que o TST utilizando da analogia do trabalhador ao consumidor hipossuficiente, entendeu que o empregador, ao não empreender ato que lhe competia (dar baixa do contrato na CTPS, por exemplo), levou a parte hipossuficiente da relação a desperdiçar seu tempo, pois precisou ingressar em juízo para obter seus direitos.

Portanto, importante que empregadores não deixem, por exemplo, de registrar funcionário sendo o contrato incontroverso; não deixe de dar baixa na CPTS ao fim do contrato de trabalho; e pague a tempo e modo as verbas rescisórias para que não incorra em nenhum pedido judicial de dano moral pela Teoria do Desvio Produtivo.

Kleber Dantas Junior
OAB/MG 55.818

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